22.6.13

O Titó

Estou sentada na varanda da casa da minha mãe, de onde vejo o mar e a montanha. Um pouco abaixo, no Parque de Santa Catarina, ouvem-se os preparativos para o Festival Sons do mar, que acontece esta noite: Mónica Ferraz, André Indiana, Azeitonas e Rui Veloso. Se há incongruências na insularidade, são os quase inexistentes concertos durante o ano, e os poucos nomes excitantes de quem vem cá tocar. O Sons do Mar está na lista dos melhores. Há pouco, ouvia-se por todo o Funchal, como se o palco estivesse montado nesta varanda, o soundcheck do Rui Veloso. Lembrei-me do primeiro concerto a que assisti, à volta dos meus inocentes 8, 9 anos, e a cantar a plenos pulmões "não há estrelas no céu".
O meu tio, que vivia em Lisboa, vinha sempre à ilha no Verão e Natal. Nesse ano, comprou bilhetes para ir ao concerto do Rui - que em Lisboa a vida talvez fosse de correria ou de concertos internacionais - e levou-me com ele. O primeiro concerto de alguém deve ser momento para ser guardado para sempre, embora nem todos tenham a mesma sorte. O meu foi especial. É bom fazermos coisas pela primeira vez, em crianças, que não sejam sempre com os pais. (Mesmo que ele tenha sido um segundo pai.) O meu tio que gostava de música clássica, de poesia e de uísque. E do Rui Veloso, nessa altura. Na verdade, hoje que guardo toda a sua colecção musical, nunca lhe conheci nenhum disco do Rui Veloso.
Era Verão e a noite estava quente. O meu tio, barba e óculos à aviador. O concerto foi na Escola Francisco Franco, o espaço maior na altura para acolher eventos. Lá, também vi os Gene Love Jezzebel e os James, à volta dos 15 anos. O meu tio, nessa noite, tinha calças de ganga e camisa azul com riscas brancas. Lembro-me como se fosse hoje. O meu tio, coração enorme e SG Gigante encaixado nos dedos. Ficámos sentados no lado esquerdo do palco, numa espécie de bancada de anfiteatro e lembro-me de estar um pouco envergonhada para cantar à frente dele. Já noite dentro, voltámos para casa de táxi. O meu tio que sempre teve pavor de conduzir e só andava de metro e de táxi. Foi jornalista, professor e publicitário. Também foi maçador, muitas vezes. Nos jantares, quando os uísques já passavam da conta e dava-lhe para retrincar as empregadas dos restaurantes. Nunca gostei disso, a minha mãe também não. O meu tio, cultura gigante e mala camel de cabedal pendurada ao ombro. O primeiro a contar-me do Senhor do Adeus. O meu tio a abandonar a faculdade porque o meu avô não quis pagar o curso. O meu tio, anos mais tarde, a pagar uma casa para o meu avô viver quando este desterrou toda a herança. A secretária do Fernando Pessoa foi a primeira mesa de trabalho do meu tio, quando começou a trabalhar em agências de publicidade. A fotografia do Pessoa, assinada pelo próprio, pendurada na parede do loft onde vivia. (Agora, na parede atrás de mim, na casa da minha mãe).
Foi um acidente bruto que tirou a vida ao meu tio, no Saldanha, no lugar do Senhor do Adeus. O taxista morreu no momento. O telefonema do hospital à 1h da manhã. A minha irmã a sair da faculdade e a passar as tardes no Hospital de São José. A minha mãe e eu enfiadas no avião para passar os dias no hospital de São José. Depois, no Hospital da Cruz Vermelha. O meu tio esteve em coma oito meses e morreu no avião, ainda em coma, quando vinha para a Madeira ser acompanhado por um dos melhores neurologistas do país. O meu tio, o tio António, o Titó. As minhas imensas saudades.
Hoje não vou ao Parque de Santa Catarina como o resto da ilha. Há concertos que só devem ser guardados uma vez, recordados com a mesma história. O meu, felizmente, foi o primeiro.

17.6.13

Façam um favor a vocês mesmos...

e leiam este texto. Sem dúvida, das melhores prosas que li nos últimos tempos. E já agora, quem ainda não o fez, toca a acompanhar a Carrosel Magazine, que é dos projectos mais interessantes que giram por aí.

Séries para que vos quero

Começo a achar que o meu vício em séries está a tornar-se perigosamente patológico. Estou, incansavelmente, à espera de um sem número de novas temporadas. Vamos a factos:

Girls - 3ª temporada, prevista para o início do próximo ano;

Breaking Bad -  2ª parte da 5ª, e última, temporada prestes a sair do forno: nunca mais é Julho, Heisenberg.

Downton Abbey -  a 4ª temporada começa a 5 de Janeiro de 2014. Caraças, ainda vou penar para saber o que vai acontecer depois da desgraça que caiu em cima do Robert.

The Americans -  2ª temporada no início de 2014. Mas quando exactamente? Não sei, ninguém sabe. Isso deixa-me com alguns afrontamentos. É a melhor série destas todas e a Keri Russel é linda de morrer. Sacana.

The Following -  2ª temporada no início do próximo ano. Mete o Kevin Bacon, o bocado de mau caminho do James Purefoy (onde é que ele andou este tempo todo?) e uma seita de serial killers viciados em livros do Edgar Allan Poe.

True Blood - a 6ª estreou ontem. On-tem. Vou respirar para um saco.

looks we love

Nova rubrica, vespertina (dentro dos meus horários, vá), onde partilho outfits de encher o olho. Marcamos às segundas-feiras para alegrar o início da semana, deal? Esta já conta.

15.6.13

Amy, a cabra cansativa

Tenho um problema sério com expectativas demasiado altas. Sempre que leio óptimas críticas de um livro, filme, álbum e por aí fora, a obra em questão cai em descrédito quando lhe pego. Está a acontecer-me isso com o "Em Parte Incerta" e agora empanquei no livro há mais de um mês. É bom, sim, é bem escrito, mas daí a ser um livro que vá "ficar comigo o resto da vida" como se escreveu por aí, não sei não.
É verdade que não sou grande adepta de livros policiais e fico mais entusiasmada pela possibilidade do David Fincher passar a história para filme do que ler o calhamaço de enfiada. Ainda assim estava à espera de ficar super curiosa e entusiasmada q.b. com o que aconteceu à malfadada Amy, de quem já me fartei um bocadinho. Nada a fazer: já percebi que a probabilidade de o ter acabado numa semana, como muita boa leitora, só aconteceria se a crítica internacional não lhe tivesse estendido tapetes vermelhos.
Para tornar tudo mais entediante, obrigatório e um suplício, não gosto de deixar livros a meio. Julgo que só posso avaliar a história se conseguir chegar ao fim e acabo por não agarrar outro livro - e tantos que estão em espera a gritar pick me! pick me! Vou, como sempre, dar-lhe uma oportunidade, na esperança da Amy aparecer, morta ou viva, da maneira mais surpreendente possível, e com o jogo psicológico mais invertebrado de todos os tempos. Vamos ver se hoje lhe pego.

10.6.13

67 dias

Dois meses. Passaram dois meses e seis dias desde a minha última visita a este blogue. Não houve razão nenhuma para não passar por cá, apenas vontade de fazer outras coisas. Foi uma boa escolha o registo virá a seu tempo. É bom voltar a casa.