18.8.12

Manhãs fechadas

Eu gostava que ele se deitasse mais cedo. Cuidasse um pouco mais de si e não apenas do vício de cafés e cigarros. Namorar com homens com tendência para as artes pode trazer alguns dissabores se estivermos a tentar encontrar o nosso lugar. Posso não saber muito bem onde estou neste momento, mas sei que lugar não quero: ficar acordada até tarde, a ver documentários na cabo, para acordar no dia seguinte às 12h intoxicada pelo fumo dos cigarros e a louça ainda por lavar. Bem sei que sair tarde do emprego troca as voltas a qualquer um, e ele tem um trabalho desses de fechar noite dentro. O preço de trabalhar num jornal diário. Juntar o horário trocado a uma certa tendência para não querer crescer muito, e à sua veia de músico, não me traz um dia a dia perfeito. Se quero estar um pouco com ele, tem de ser tarde na noite, enfiados no sofá e nos cigarros. Já tantas vezes dissemos que o melhor é acordarmos cedo e aproveitarmos a manhã. Sabemos que à noite eu já estou cansada, ele ainda mais. Eu bem sei o que é não gostar de um trabalho exigente, e percebo. Ele não gosta do jornal onde trabalha, chega de cara fechada e quando não o faz, é um esforço para estar bem dentro de casa. Mas as pessoas não podem fingir quando estão tristes.
Há meses que combinamos acordar cedo, tomar um pequeno-almoço com cheiro a café, sumo de laranja e torradas com compota caseira. Conversar, namorar, ler os jornais e dar um passeio no parque. Depois, deixava-o no trabalho e tratava do meu dia. À noite ele chegava mais feliz porque tinha aproveitado a manhã fora da redacção, podíamos não conversar nem namorar muito, mas dormíamos aconchegados um no outro, protegidos um pelo outro, como nos sentimos um dia. Hoje, quando nos deitamos, há um abismo entre os dois. Abraçados com um abismo no meio. Há meses que combinamos acordar cedo e aproveitar a manhã, mas eu já não sei se acredito. E é dessa dúvida que tenho medo.

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